Sou um animal sentimental
17:00
A noite tinha sido
divertida, mas ali no
metrô, sabia que não era assim que ela queria estar as cinco da manhã do domingo. Ela
preferia estar beijando alguém.
Percebendo que todos no vagão estavam
ou de costas, ou de olhas fechados, ou com o olhar baixo, ela olhou um a um.
Por uma simples questão de natureza humana, seus olhos pararam num rapaz que
dormia, sentado num lugar com o ângulo perfeito para ser observado por ela. O
rapaz adormecido era lindo, olhos fechados que faziam de sua cor um
mistério. As pessoas não caem muito bem
nesses sonos desesperados, acabam sempre com a boca aberta demais, babando e
tombando a cabeça incessantemente, mas ele não, ele estava dormindo bonito, com
os lábios fechados e a cabeça apoiada.
Depois de examiná-lo dos
pés a cabeça, ela se revezou entre desviar os olhos, e voltar a olhá-lo,
repetindo dentro de sua cabeça: Olhe para
mim, olhe para mim, olhe para mim...
Ele chegou a acordar, e
sem encará-lo, apenas passando os olhos pelo vagão, ela viu seus olhos
castanhos. Mas ele não a olhou de volta, não olhou para lugar nenhum, deitou a
cabeça e logo caiu no sono novamente. Isso aconteceu mais duas vezes, até que
ela se viu na estação anterior a sua de destino.
Se levantou
indo até a porta próxima ao desconhecido adormecido, ele parecia estar
despertando, mas ela não quis olhar, nada aconteceria e nunca mais ia vê-lo
mesmo. Mas então quando as portas se abriram, com sua visão periférica ela viu
que ele tinha se levantado também, e caminhava alguns passos atrás dela. Seu lado racional continuava achando que nada aconteceria e ele sumiria
como todos os estranhos que notamos pelos caminhos no dia a dia, mas outro lado
tinha criado uma esperança ao vê-lo descer na mesma estação, e a fazia olhar
para trás despretensiosamente, para ser notada. Ela não podia ver com certeza se ele a olhava, apenas
continuou andando, desistindo de checar se ele ainda estava por ali.

- Você foi a primeira coisa que eu vi quando
abri os olhos para sair do vagão. – ele disse.
---Michelle Ribeiro
"I spun around till I was dizzy; I thought I’d fall down as in a dream, clear off the precipice. Oh
where is the girl I love? I thought, and looked everywhere, as I had looked everywhere in the little
world below." (On the road)
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